Comunicação

A Igreja deve formar e educar para a comunicação

Foto: Pascom Diocese de São Carlos

Entrevista com Joana T. Puntel *


“A Igreja Católica carece de formação sobre a ‘cultura’ da comunicação e a sua constante atualização, para poder entender o desenvolvimento constante das linguagens, da mediação, da recepção que a cultura midiática exige hoje”.

Essas palavras são da religiosa Joana T. Puntel, da equipe do Serviço à Pastoral da Comunicação (Sepac) das Paulinas, com doutorado em Comunicação e pesquisa na The London School of Economics and Political Science, na Inglaterra. Ela está lançando o livro “Cultura midiática e Igreja – uma nova ambiência”, resultado de uma pesquisa que vem desenvolvendo nestes últimos anos sobre a cultura da comunicação e a Igreja.

A escritora defende a formação e a educação para a comunicação e que isso implica conhecer e evangelizar dentro da cultura midiática, ou seja, compreender seus paradigmas, sua linguagem, seus processos. Aos bispos e padres que ainda não dão prioridade à comunicação, irmã Joana sugere que leiam e coloquem em prática os documentos oficiais da Igreja sobre o tema.

Conforme ela, neles encontramos grande e progressiva insistência para a formação, a educação para a comunicação, inclusive na última carta apostólica de João Paulo II (janeiro 2005), “O Rápido Desenvolvimento”.

Fale um pouco sobre o seu livro “Cultura midiática e Igreja – uma nova ambiência”, que a senhora está lançando.

O livro “Cultura midiática e Igreja – uma nova ambiência” é o resultado de uma pesquisa que venho desenvolvendo nestes últimos anos sobre a cultura da comunicação e a Igreja. Sobretudo os estudos que realizei, como pós-doutorado em comunicação na The London School of Economics and Political Science, na Inglaterra, e a minha prática de militante por longos anos, na área da comunicação voltada para a Igreja, contribuíram para o aprofundamento do tema.

As razões que me levaram a fazer essa pesquisa e a examinar a comunicação em profundidade, principalmente a cultura da mídia, são, em primeiro lugar, o forte impacto causado por algumas declarações da Igreja Católica sobre a comunicação, sua forma de lidar com a cultura da mídia e a definição de comunicação como uma “nova cultura”.

Em sua encíclica intitulada Redemptoris Missio, o Papa João Paulo II não fala mais dos meios de comunicação como um veículo de evangelização, mas lhes atribui uma perspectiva mais global, falando do mundo das comunicações como um setor importante da cultura moderna.

Assim ele afirma, no nº 37: “Não é suficiente usar a mídia para difundir a mensagem cristã e o Magistério da Igreja, mas é necessário integrar a mensagem nessa ‘nova cultura’ criada pelas modernas comunicações. É um problema complexo, pois essa cultura nasce menos dos conteúdos do que do próprio fato de existirem novos modos de comunicar com novas linguagens, novas técnicas, novas atitudes psicológicas”.

E continua o Papa: “Talvez se tenha descuidado um pouco deste areópago: deu-se preferência a outros instrumentos para o anúncio evangélico e para a formação, enquanto os mass-media foram deixados à iniciativa de particulares ou de pequenos grupos, entrando apenas, secundariamente, na programação pastoral.

O uso dos mass-media, no entanto, não tem somente a finalidade de multiplicar o anúncio do evangelho: trata-se de um fato muito mais profundo, porque a própria evangelização da cultura moderna depende, em grande parte, da sua influência. O meu predecessor, Paulo VI, dizia que a ruptura entre o evangelho e a cultura, é, sem dúvida, o drama da nossa época”. 

O meu livro, portanto, quer ser uma ferramenta para a formação de estudantes e pessoas interessadas em aprofundar a cultura da comunicação, através dos tempos, e a relação da Igreja com essa cultura, bem como a necessidade de nos abrir para ela e evangelizar com ela.

A Igreja Católica tem dificuldades para se conectar à nova cultura midiática?

Depende do que entendemos por “se conectar”. Se tomarmos pelo lado de “fazer uso dos meios de comunicação”, acredito que exista um esforço crescente para avançar nesse campo, segundo as diversas mentalidades no campo da compreensão sobre a necessidade de “estar e atuar” no contexto de sociedade hodierna que utiliza tais meios. Entretanto, se tomarmos pela consideração do conectar-se “à cultura midiática”, a questão se torna mais complexa. Acredito que exista bastante dificuldade nesse campo, isto é, a Igreja carece de formação sobre a “cultura” da comunicação e a sua constante atualização, para poder entender o desenvolvimento constante das linguagens, da mediação, da recepção que a cultura midiática exige hoje. É necessário a formação, a educação para a comunicação; e esta implica conhecer e evangelizar dentro da cultura midiática, isto é, compreender seus paradigmas, sua linguagem, seus processos.

O pesquisador e professor Luiz Mauro Sá Martino disse, numa entrevista ao “JORNAL  OPINIÃO”, que a comunicação feita pela Igreja Católica é amadora se comparada à de outras Igrejas. O que a senhora pensa sobre isso?

Concordo plenamente. Mas é sempre uma questão a ser discutida, procurando identificar a falta de profissionalização, de estratégias, de marketing, mas, sobretudo do viés cultural, que implica conhecer os processos da comunicação.

O que falta para que a imprensa católica conquiste mais ouvintes, telespectadores e leitores?

Acredito que não se trata somente do fato de “conquistar”. No campo profissional e, sobretudo, no cultural, os processos da comunicação deveriam estar mais presentes, permeando as programações, as decisões de pautas. Muitas vezes caímos no amadorismo. Os princípios fundamentais da evangelização não existem “no ar”. Eles se revestem da cultura midiática atual, como, por exemplo, as linguagens.
Alguns veículos da grande imprensa têm atribuído à Igreja Católica uma postura retrógrada quando ela se posiciona com firmeza sobre alguns princípios.

Quais os prejuízos que isso pode trazer para a imagem da Igreja Católica? Como responder a essas críticas?

Penso que seguir o magistério da Igreja não significa ser retrógrado. O que acontece, muitas vezes, é a forma e a linguagem com que se apresentam os argumentos. Desejo profundamente que a Igreja dialogue sempre mais com a ciência, o que não significa sempre concordar, mas dialogar e crescer no diálogo, sim.

O que a senhora diria para bispos e padres que ainda têm dúvidas se devem ou não investir na comunicação?

Que leiam e coloquem em prática os documentos oficiais da Igreja sobre a comunicação. Neles encontramos grande e progressiva insistência para a comunicação. Inclusive na última carta apostólica de João Paulo II (janeiro 2005), O Rápido desenvolvimento. Nesse sentido o Serviço à Pastoral da Comunicação (SEPAC), em São Paulo, contribui fortemente para a educação da comunicação, principalmente no que diz respeito à Igreja.

Como desenvolver um programa eficiente de comunicação em uma diocese ou paróquia com poucos recursos financeiros?

Os recursos financeiros constituem um dado importante e imprescindível a ser considerado. Mas devemos ter atenção, pois ele acaba servindo de desculpas para outro fator mais importante, ou seja, a falta de preparação, de organização e de formação para a comunicação.

Antes da eleição de Bento XVI, dizia-se que o novo Papa deveria ter muita habilidade para lidar com a mídia. Qual a sua expectativa em relação à Igreja Católica e à mídia durante esse papado?

Cada pessoa possui suas características próprias. Acredito que em grande parte a mídia mostrou a pessoa de João Paulo II, mas seria muito importante que seguisse os seus ensinamentos sobre a comunicação, o seu pensamento através dos vários documentos sobre a comunicação, por exemplo, a questão da ética na comunicação, para citar um exemplo. Acredito que temos muito conteúdo a aprofundar sobre a comunicação, mais do que somente esperar novidades.


* Entrevista feita por Eduardo Franco – do Jornal Opinião – 16-22 de maio de 2005, no. 833 – ano 17 – Belo Horizonte – MG.

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