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Educação Warao

 

Foto: Cáritas Arquidiocesana de Brasília

Em Mato Grosso temos mais de 44 povos indígenas e a iniciativa de um Acampamento Terra Livre regional acontece no começo de abril. Estes espaços têm sido uma experiência de mobilização e crescimento também para os Warao, que interagem com o movimento indígena no Brasil, para se mostrarem e serem mais eficazes em suas reivindicações, uma vez que as elites políticas regionais têm se posicionado de forma anti-indígena e anti-pobre.

Respiramos outros ares em nível federal, neste momento político, mas em muitos lugares as bases resistem para sustentar o processo longo e sistemático de invasão dos territórios tradicionais indígenas. Uma dessas etnias que desafia nossos tempos e percepções de mundo veio da Venezuela, são os Warao, que sofrem grande preconceito por serem indígenas e por serem venezuelanos.

Tivemos uma semana em diálogo interinstitucional em Cuiabá com a presença do antropólogo Gabriel Calil Maia Tardelli, que assessora a UNHCR, e Bruno Wrýpãtwir Kanela, Coordenador de Políticas para Indígenas em Situação de Contexto Urbano, Secretaria Nacional de Articulação e Promoção de Políticas Indígenas, Coordenação-Geral de Promoção da Cidadania de Combate ao Racismo, que transpôs a realidade local para uma visibilidade nacional.

A articulação no Ministério das Cidades para as moradias definitivas, também para uma escola na Comunidade, talvez supere estruturas mais provisórias, que atenderam a urgência da falta de moradia para esses migrantes. Aqui desejo falar da Escola Warao a ser estabelecida com urgência. 

A mediação junto à secretaria de educação de Mato Grosso e financiamento da produção artesanal de mulheres Warao está sendo articulada por Marinete Luzia Francisca de Souza, docente do Curso de Letras Literatura – UFMT, que tem auxiliado nas demandas junto às autoridades da educação específica e diferenciada (intercultural), para os Warao de Mato Grosso. 

A escola para 86 crianças e adolescentes da etnia Warao que vivem na cidade de Cuiabá é uma demanda surgida em diferentes reuniões do Conselho de Educação Indígena no Mato Grosso. Quando os Warao conseguiram se juntar no Bairro São José, foi feito pedido em 21 abril de 2023, texto manuscrito em língua Warao e em espanhol e protocolado na SEDUC.

As crianças nominadas com graus de estudos diferenciados estão fora da escola desde que chegaram em Cuiabá, em janeiro de 2020. Isso ocorre porque as escolas estaduais não têm salas adaptadas para estrangeiros que falam a língua Warao, porque a Seduc não quer criar a Escola Warao e o mais grave, parece que não os considera cidadãos merecedores desse serviço público. 

Algumas crianças foram matriculadas em escolas em Cuiabá e em outras cidades antes de chegar em Cuiabá, mas sofreram bullying e inclusive agressão física nas escolas por serem indígenas e venezuelanas.

As crianças não conseguem acompanhar as aulas na língua portuguesa e a culpa é jogada na criança. Foi solicitado, novamente, este ano, à SEDUC a criação de escola bilíngue ou de sala anexa, assim como contração de professor de língua Warao, para superar as dificuldades.

Foto: Freepik

Isso porque a legislação garante aos indígenas o ensino bilíngue como uma forma de não destruição de sua língua e cultura. Além disso, o pedido foi refeito em janeiro de 2024, via reunião, com as diferentes autoridades institucionais por considerar que o direito à educação escolar está sendo negado a essas crianças. 

Atualmente, 33 adolescentes estão matriculados na Escola Estadual Santos Dumont no Fundamental II, mas não estão frequentando as aulas. Ainda estão à espera de autorização para funcionamento da sala trilingue (Warao, espanhol, português) por parte da Secretaria Estadual de Educação.

Também se espera que um ônibus os leve para a Escola, porque saem todos do mesmo lugar e vão para o mesmo lugar, o que garantiria mais segurança e tranquilidade. As outras crianças são do Ensino Fundamental I e foi solicitado ao município uma sala anexa por meio da escola, que tem vagas, a EMEBC Nova Esperança perto do local para onde a comunidade Warao se mudará em abril de 2024. Desse modo, a autorização da Secretaria Municipal de Educação (SME) para que a sala possa funcionar no local onde estão facilitaria o acesso das crianças.

Por outro lado, cada dia fora da escola é um dia a mais de prejuízo na vida dessas crianças. Por isso, pedimos o apoio do Ministério Público do Estado de Mato Grosso na defesa das crianças Warao. Ou seja, pedimos às duas secretarias (SEDUC e SME) para garantir os direitos infantis.

O mais dramático é que o desafio está posto para a maioria das cidades do Brasil e não encontramos nesses tempos digitais uma instituição ou uma Congregação que abrace os Warao em seu modo de estar aqui e acolá com um sistema de educação em que eles pudessem estar matriculados na Escola e mesmo que mudasse de cidade, os trâmites burocráticos fossem mínimos para que o fluxo escolar não impediria de estudarem um tempo em Porto Alegre ou Belo Horizonte e outro tempo em Cuiabá ou São Paulo, por exemplo.

 

Aloir Pacini é jesuíta, professor no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).

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