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Na era digital, senhas se tornaram chaves de acesso não apenas a redes sociais, mas também a contas bancárias, arquivos importantes, documentos armazenados na nuvem e outras informações cruciais.
Diante disso, a ausência de uma organização prévia quanto ao destino e ao compartilhamento dessas credenciais pode causar grande transtorno aos familiares, especialmente no momento delicado da perda de um ente querido. A seguir, destacam-se três pontos essenciais sobre como proteger e gerenciar senhas de forma segura e responsável, inclusive após a morte.
A importância da gestão preventiva de senhas pessoais
Guardar senhas apenas na memória ou em anotações físicas pouco seguras é uma prática comum, mas arriscada. Em muitos casos, quando uma pessoa falece, familiares ou cônjuges se deparam com dificuldades para acessar contas bancárias, redes sociais, plataformas de investimentos e outros serviços essenciais, o que pode atrasar inventários, dificultar o encerramento de contratos e até mesmo causar perdas financeiras.
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Por isso, recomenda-se que cada pessoa mantenha suas senhas organizadas de forma segura e atualizada. Utilizar gerenciadores de senhas criptografados pode ser uma solução prática e moderna. Esses aplicativos permitem que todas as credenciais fiquem armazenadas em um único local seguro, acessível mediante uma senha-mestre.
Além disso, é prudente que o titular compartilhe, de forma controlada, o acesso a esse gerenciador ou a informações-chave com alguém de absoluta confiança, como um cônjuge, filho ou advogado. O objetivo é prevenir situações em que ninguém consiga acessar contas essenciais no momento da sucessão.
Nomear uma pessoa de confiança: cuidados e limites
Dividir senhas com alguém de confiança não significa abrir mão da segurança. Pelo contrário, trata-se de um ato de planejamento responsável, desde que feito com cautela. O ideal é que essa pessoa esteja ciente de sua responsabilidade ética e legal, e que tenha instruções claras quanto ao momento e à forma de utilizar essas informações.
Uma alternativa prática e juridicamente segura é deixar essas orientações registradas por escrito em um documento particular com firma reconhecida, no qual se identifique a pessoa autorizada e a lista de plataformas importantes, sem necessariamente detalhar as senhas em si. Esse documento pode ser guardado com um advogado ou dentro de um cofre seguro.
Por outro lado, é essencial destacar que, mesmo com o compartilhamento de senhas, ainda há limites legais: por exemplo, o uso indevido de contas de titular falecido sem autorização judicial pode configurar fraude ou violação de direitos sucessórios. Portanto, toda partilha de informações deve respeitar o ordenamento jurídico.
O testamento digital: previsão legal e aplicação prática
Uma ferramenta cada vez mais relevante para lidar com a herança digital é o testamento digital. Trata-se de uma modalidade de testamento que contém disposições específicas sobre o destino de bens e informações digitais do testador, como contas em redes sociais, arquivos armazenados online, acessos a contas bancárias virtuais e até mesmo criptomoedas.
No Brasil, embora o Código Civil ainda não trate expressamente do “testamento digital”, é plenamente possível incluir disposições digitais em testamentos ordinários — como o testamento público, lavrado em cartório, ou o testamento particular, feito com testemunhas.
O artigo 1.857 do Código Civil garante ao testador ampla liberdade para dispor de seus bens, desde que respeitada a parte legítima dos herdeiros necessários. Essa liberdade pode abranger também os bens e acessos digitais, desde que com clareza e formalidade.
É possível, por exemplo, determinar que determinada pessoa fique responsável por encerrar ou manter ativa uma conta em rede social, que outra acesse um cofre digital com senhas, ou mesmo indicar a destinação de criptomoedas armazenadas em carteiras digitais. O testamento digital, portanto, é uma forma segura de organizar o pós-vida digital, resguardando vontades e evitando disputas entre familiares.
Cuidar da proteção das senhas pessoais é uma responsabilidade que ultrapassa a segurança individual: ela impacta diretamente familiares e sucessores. A organização, o compartilhamento controlado com pessoas de confiança e o uso de instrumentos jurídicos como o testamento digital são formas de garantir tranquilidade e prevenir transtornos no momento da sucessão.
Em um mundo cada vez mais conectado, planejar o futuro digital também é um ato de amor e responsabilidade com quem fica.
Gabriel Carvalho dos Santos, mestre em Direito da Sociedade da Informação pelo Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas de São Paulo (FMU). Residente Jurídico no TJPR. Contato: [email protected].