“Com efeito, a vida espiritual do cristão não é pacífica, linear e isenta de desafios, mas, pelo contrário, exige um combate contínuo. O combate cristão para conservar a fé e para enriquecer o dom da fé em nós. Não é por acaso que a primeira unção que todo cristão recebe no Sacramento do Batismo – a unção catecumenal – não tem perfume e anuncia simbolicamente que a vida é uma luta”. (Audiência geral de 03 de janeiro de 2024)
Quem fala sobre a espiritualidade do papa Francisco é:
Padre Laércio Lima, sj, mestre em Teologia Espiritual Inaciana pela Universidade Gregoriana, em Roma, autor de várias obras.
Intimidade com Cristo Jesus
“Falar do papa Francisco e da sua experiência espiritual, daquilo que o sustenta, é falar da experiência de Cristo que Jorge Mario Bergoglio fez enquanto jovem jesuíta, quando sentiu o chamado a ser padre, entra na Companhia de Jesus e faz uma experiência profunda com os exercícios espirituais. É uma experiência fundante na sua vida. O fundamento dos exercícios espirituais é colocar Jesus no centro de qualquer vida. É uma escola de oração e uma escola dos afetos para compreendermos que não dá para seguir Jesus com uma vida desordenada.
Por isso, os exercícios espirituais colocam a nossa vida em ordem, ou seja, orientada para a pessoa de Jesus e seu projeto de reino. Francisco é um papa aos moldes da sua espiritualidade, ele é jesuíta aos moldes da espiritualidade inaciana, pois foi ela que o moldou. A espiritualidade inaciana coloca Cristo no centro da nossa vida.
A eleição e a escolha que Bergoglio fez por Cristo ainda jovem perpassou toda a sua vida, toda a sua vocação. A sua seriedade com o tema espiritual, com a oração e a forma como ele coloca a Igreja em caminhada, peregrina, em saída, porém não dispersa, mas focada no Evangelho que é Cristo, está fazendo com que a própria Igreja busque suas desordens, seus afetos desordenados e faça um discernimento sério a respeito: Cristo é o centro da Igreja?
O que sustenta Francisco é uma experiência profunda e arraigada na pessoa de Jesus Cristo, é a intimidade com Jesus, é o silêncio de um homem idoso que acorda às 4h da manhã para rezar. O que sustenta Francisco é a intimidade profunda que desperta nele um estupor diante da presença de Cristo no cotidiano, não nas coisas maravilhosas, mas na simplicidade.
Foto: Viviani Moura, fsp
Ele é um homem do simples, do essencial. O papa é um homem com uma espiritualidade simples, porém profunda, densa, uma espiritualidade íntima que tem Cristo Jesus como centro.
Importante destacar sua experiência de ver Deus em todas as coisas, nas coisas simples, não é um homem de espetáculo, mas Deus se manifesta no simples para ele.
Algumas encíclicas e cartas estão profundamente inspiradas nos exercícios espirituais. A Laudato si' é um hino de louvor à criação, ao mesmo tempo, quem conhece os exercícios espirituais vai perceber como tem muito do fundamento dos exercícios espirituais e da contemplação para alcançar o amor.
É um pontificado cheio de inacianidade, porém não tem o objetivo de tornar a Igreja inaciana. É porque a fonte espiritual dele é inaciana. É assim que ele reza, é assim que ele pensa, é assim que ele fala. Ele fala daquilo que bebeu, que o sustentou em toda a sua vida: os exercícios espirituais de Santo Inácio, por isso ele coloca a Igreja em caminho de discernimento para ter condições de, a partir do silêncio, da oração e da escuta profunda, escutar os gritos e os ‘ais’ da sociedade e da Igreja nos dias atuais”.
Leia também:
Legado de Francisco:
- A missão das viagens apostólicas
- Comunicação que fala com o coração