“Uma Igreja sem as mulheres é como o Colégio Apostólico sem Maria. A Igreja é feminina, é esposa, é mãe. Gosto também de pensar que a Igreja não é o Igreja, é a Igreja. A Igreja é feminino, é mãe e devemos aprofundar a nossa compreensão disso”. (Voo papal de retorno da JMJ no Rio de janeiro, 28 de julho de 2013)
Encontro do Papa Francisco com as Irmãs Paulinas de várias nações. Foto: Arquivo Paulinas
Francisco sempre reiterou a importância da contribuição das mulheres para a reflexão teológica. Dizia que faz falta uma teologia feita pela mulher, ressaltando a doçura, o carinho, a ternura da mulher. Quem fala sobre a maior participação feminina na Igreja no pontificado de Francisco é:
Maria Clara Lucchetti Bingemer, mestra em Teologia pela PUC-Rio, doutora em Teologia Sistemática pela Pontifícia Universidade Gregoriana, em Roma. Foi nomeada pelo Papa Francisco consultora para a Secretaria Geral do Sínodo dos Bispos.
Mulheres que decidem
“Eu conhecia Jorge Mario Bergoglio desde seus tempos de arcebispo de Buenos Aires. Meu marido, Ekke Bingemer, é argentino e eu o acompanhei muito em suas viagens quando era diretor para a América Latina da Fundação Porticus. Me recordo que era muito sério, quase não sorria. Totalmente diferente do Papa Francisco, que é essa simpatia e esse sorriso constante.
Com Francisco estive umas duas ou três vezes, mas em audiências com bastante gente. Tive a alegria de cumprimentá-lo. Sempre muito simpático e atento. Mas nessas ocasiões não se pode conversar muito. Trocamos poucas palavras.
A nomeação para o Sínodo foi uma surpresa, confesso. Havia sido sondada um ano antes. Nada havia acontecido e já era o final do processo. Finalmente, encontrando-me eu em Roma, recebi já tarde da noite a carta que dizia que o Papa anunciaria a nomeação ao meio-dia do dia seguinte. Que eu por favor não falasse com ninguém antes disso. O que me impressionou foi a repercussão disso, a quantidade de pessoas que me telefonou, me escreveu. Isso me alegrou, que fosse uma alegria para tantos e tantas.
O trabalho no grupo foi bom, com teólogos ilustres, e eu a única mulher. Acho que o documento final ficou um pouco aquém do que foi falado nos grupos, mas isso já era de se esperar. Perdeu um pouco a força em vez de falar das mulheres, usar palavras como reciprocidade, etc. Mas pelo menos ali está. E agora há que trabalhar no pós Sínodo para que a igreja sinodal aconteça mais e mais.
Papa Francisco com a Superiora Geral, Irmã Anna Caiazza e a Vigária Geral das Irmãs Paulinas, Irmã Clarice Josefa Wisniewski . Foto: Arquivo Paulinas
Acredito que a maior conquista do pontificado do Papa Francisco em relação às mulheres foi a nomeação de mulheres para cargos de tomada de decisão. Pela primeira vez, vemos mulheres assumindo cargos como secretária de um órgão do Vaticano, como a CAL (Emilce Cuda), ecônoma do Vaticano (Alessandra Esmerili), subsecretária do Sínodo (Nathalie Becquart), etc. Isso contribuiu muito para a visibilidade das mulheres diante da Igreja. Não é mais um enorme muro de masculinidade.
Assinalo, no entanto, o detalhe de que são todas ou quase todas religiosas – Emilce Cuda é exceção, assim como Cristiane Murray, que é brasileira e responsável pela Sala Stampa. Claro que as religiosas canonicamente são leigas, mas a imagem que aí é transmitida não vai em direção a uma inclusão da mulher como um todo. Apenas mulheres com um vínculo oficial com a instituição.
Para mim isso não é um problema. Mas converso com muitas pessoas para as quais é. Em todo caso, creio que essas nomeações abriram um caminho de visibilidade que foi muito positivo e do qual será difícil voltar atrás.
Foto: Arquivo Paulinas
Isso implica uma visão fundamental das mulheres que é positiva. O mais positivo para um Papa até agora. E fica claro que Francisco tem uma relação de confiança com diversas mulheres, tratando-as com respeito e carinho como amigas. Ele liga para elas, escreve para elas. Ele continua declarando a necessidade de uma teologia a partir da perspectiva das mulheres, embora não chegue a dar o passo em direção a uma teologia de gênero.
A exortação Amoris Laetitia não é sobre mulheres, mas é um documento que as favorece muito, com sua visão de amor, casamento e família. Talvez mais do que a carta de João Paulo II "Mulieris Dignitatem", que ainda apresenta uma visão bastante idealizada das mulheres.
A promoção da mulher dentro da Igreja é uma frente de batalha desafiadora. Francisco a assumiu e lutou essa batalha. Mas não foi sua prioridade, eu diria. Isso era de se esperar, porque ele tinha várias frentes de batalha e não poderia atender a todas”.
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