
Irmã Lourdes Dill, das Filhas do Amor Divino, partilha a sua experiência missionária. Foto: Arquivo Pessoal
No Mês Missionário, a Irmã Lourdes Dill, das Filhas do Amor Divino, partilha a sua experiência no interior de Moçambique e revela como a fé, a coragem e a solidariedade sustentam um povo que transforma a pobreza em alegria. Confira a entrevista, a seguir:
Como nasceu sua vocação missionária?
Minha vocação começou muito cedo, quando eu tinha apenas seis anos. Uma irmã das Filhas do Amor Divino visitou nossa casa, e algo no seu testemunho despertou em mim o desejo de também ser religiosa. Eu dizia ao meu pai e à minha mãe: “Um dia quero ir para a África”. Eles achavam impossível, porque era muito longe. Mas esse sonho nunca me deixou. Aos treze anos, entrei para o juvenato das Irmãs Paulinas, em Porto Alegre (RS). Após um tempo, encontrei meu caminho definitivo na Congregação das Filhas do Amor Divino, em Cerro Largo (RS). Hoje, aos 74 anos e com 48 de vida religiosa, vejo como Deus conduziu tudo com delicadeza e amor.

Foto: Arquivo Pessoal
Como surgiu o convite para a missão em Moçambique?
Em 2023, nossa Província Nossa Senhora da Anunciação, com sede em Santa Maria (RS), decidiu abrir uma missão em Moçambique, a convite do padre Luiz Weber e com o apoio da Igreja local. Quando soube que estavam pedindo irmãs voluntárias, escrevi à provincial e disse: “Estou disposta a ir”. Não fui convidada, eu me ofereci. Era o chamado que o Espírito Santo já vinha cultivando em mim desde menina. Chegamos a Moçambique em setembro de 2023 e formamos a comunidade Luz da Aurora, com quatro irmãs. Vivemos na região de Mecanhe, na arquidiocese de Nampula.
Como é a realidade do local onde vocês realizam a missão?
O povo daqui é muito alegre, acolhedor e corajoso. Gosta de cantar, dançar e celebrar, mesmo tendo tão pouco. Essa simplicidade me evangeliza todos os dias. As pessoas valorizam o essencial e têm uma fé viva, comprometida com a comunidade. Mas também enfrentam muitos desafios: a seca, a fome, o desemprego e a falta de água. As famílias caminham quilômetros para buscar água nos poços comunitários. Quando conseguimos perfurar um novo furo, é uma verdadeira festa.

Foto: Arquivo Pessoal
Quais são os principais desafios enfrentados pelo povo moçambicano?
Moçambique é um país muito rico em recursos naturais, mas essas riquezas não ficam com o povo. São, em grande parte, exploradas por empresas estrangeiras, que extraem tudo o que podem e depois vão embora, sem gerar benefícios locais. A pobreza aqui é imensa e se manifesta em todas as dimensões: falta de políticas públicas, de oportunidades de trabalho, de acesso à saúde e à educação. A maioria das pessoas vive da agricultura familiar, nas chamadas machambas, onde plantam milho, feijão, arroz e amendoim. Mesmo com uma terra arenosa e o desafio da seca, elas fazem verdadeiros milagres para sobreviver. É um povo pobre, mas que não reclama, que se alegra com o pouco e conserva uma força admirável.

Foto: Arquivo Pessoal
Entre tantas carências, o acesso à água parece ser um dos maiores desafios. Como é essa realidade?
Sim, a água aqui é um verdadeiro tesouro. Pouquíssimas famílias têm poço em casa e ninguém possui água encanada. As pessoas caminham quilômetros com baldes na cabeça para buscar água nos poços comunitários, chamados de furos. Essa água serve para beber, cozinhar, lavar e, quando sobra, tomar banho. Muitas vezes recorrem aos rios, quando ainda há água neles. Por isso, cada novo poço aberto é motivo de festa e de gratidão. Nós, como comunidade missionária, também nos empenhamos em projetos para perfurar poços artesianos e aliviar um pouco o sofrimento das famílias. Contamos com uma entidade parceira nos projetos de capacitação de recursos para obtenção de água, a AJUDEMU (Associação Juvenil para o Desenvolvimento de Murrupula). É emocionante ver como algo tão simples para nós, como abrir a torneira, aqui se torna um verdadeiro milagre diário.

Foto: Arquivo Pessoal
Você já enfrentou situações difíceis na missão?
Sim. Durante um período de instabilidade política, houve invasões e vandalismo em várias regiões do país. Na véspera de Natal, em 2023, alguns homens entraram em nossa casa. A irmã Madalena e eu tivemos de fugir para o mato e pedir socorro. A comunidade veio nos ajudar e, graças a Deus, ninguém se feriu. Mesmo assim, continuamos firmes. Ser missionária é também confiar que Deus cuida de nós em meio às provações.

Foto: Arquivo Pessoal
O que significa, para você, viver este Mês Missionário?
É tempo de renovar o compromisso com o Evangelho e com o Reino de Deus. Todos os batizados somos missionários, onde quer que estejamos. Uns são enviados para longe; outros evangelizam no dia a dia, na família, no trabalho, na comunidade. O importante é ter o coração aberto e disponível. Quando deixei minha terra e cheguei à África, percebi que a missão é isso: encontrar Deus no olhar do outro. E é nessa troca que a fé se torna viva e verdadeira.
Conheça mais sobre a irmã Lourdes Dill e o Projeto Uma Gota de Esperança neste vídeo:
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