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Hoje, quando utilizamos a expressão “terra”, precisamos saber do que estamos falando. Se é “Terra”, com T maiúsculo, estamos falando de nosso planeta, nossa Pachamama, ou como diz o Papa Francisco, da nossa Casa Comum. É um nome próprio que designa o planeta que habitamos.
Se falamos em “terra”, com t minúsculo, podemos estar falando dos territórios indígenas, quilombolas, ou de qualquer outra comunidade tradicional que costuma utilizar suas terras de forma comunitária.
Ou então, ainda de forma minúscula, pode significar aquele pedaço de chão que é utilizado para alguma finalidade, para produzir um cultivo de arroz, feijão, mandioca, soja, ou qualquer outra atividade agrícola. A terra ainda pode ser pública ou privada, caso pertença à União, ou à uma propriedade privada.
Porém, quando falamos no Estatuto da Terra, estamos falando de uma lei brasileira de 1964, elaborada durante o Regime Militar Brasileiro, que estabelece as regras para a apropriação e uso da terra no Brasil (Lei nº 4.504 de 30 de novembro de 1964). Tinha e tem o propósito de fazer uma reforma agrária e ordenar a política agrícola, onde a terra seja utilizada para produzir bens essenciais a todo povo brasileiro, cumprindo uma função social. Claro que esse último princípio se refere à Doutrina Social da Igreja que preconiza o bem comum acima da propriedade privada. Ainda mais, propõe que, ao usar a terra, sejam conservados os recursos naturais: “c) assegura a conservação dos recursos naturais” (art. 2º, §1º, “c”, do Estatuto da Terra).
Então, ainda que de forma embrionária, o próprio Estatuto da Terra já previa a necessidade de pensar e praticar um uso da terra que fosse de forma sustentável. Hoje em dia não se pode falar do uso dos “recursos naturais”, seja o solo, seja a água, seja a biodiversidade, sem que se pense de forma orgânica a interação de tudo com o todo.
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O fato é que a Reforma Agrária nunca veio, a não ser quando os movimentos organizados a conquistaram pela força de suas organizações e lutas. Movimentos da sociedade civil hoje lutam por uma agroecologia adequada a cada bioma, por alimentos limpos e sadios, pela democratização da terra, da água e da biodiversidade. Ainda mais, comunidades inteiras buscam o reconhecimento de seus territórios como um lugar de vida, de cultura, muito além de um espaço de produção. Nesse caso, a Constituição Brasileira de 1988 reconheceu esses direitos e é por eles que comunidades indígenas, quilombolas e outras tradicionais têm feito suas lutas.
Para completar, voltemos à Terra, nossa Casa Comum, que ao modo de dizer de James Lovelock, também precisa de seus espaços para produzir seu próprio metabolismo. Então, nem toda a terra da Terra está disponível para o ser humano. Estamos aprendendo essa realidade a cada dia, a cada aumento da temperatura, a cada tragédia socioambiental que as comunidades já enfrentam.
Talvez esteja na hora de um novo Estatuto da Terra.
Roberto Malvezzi, graduado em Filosofia, Teologia e Estudos Sociais. Membro da Comissão Especial de Ecologia Integral e Mineração – CNBB. Membro da Equipe de Assessoria da REPAM-BRASIL – CNBB. Escritor e Compositor. Autor do musical Cristificação do Universo, Paulinas/COMEP, onde se encontra a música Hosana Hey.