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O filme Conclave e os caminhos da Igreja

Praça São Pedro - Vaticano, Roma. Foto: Pexels

O filme "Conclave", dirigido por Edward Berger, tem se destacado não apenas como um retrato intrigante da Igreja Católica, mas também como um sucesso crítico. O filme explora a complexidade e as tensões internas da Igreja de maneira única, fugindo do clichê dos thrillers de conspiração para mergulhar nas nuances de poder, política e fé que permeiam um conclave papal. Este enfoque diferenciado permitiu a "Conclave" não só capturar a atenção do público, mas também ser reconhecido na temporada de premiações, culminando na conquista de dois Oscars.

Diferentemente de filmes como "Anjos e Demônios" de Dan Brown, "Conclave" opta por uma abordagem mais matizada, apresentando cardeais que são personagens complexos, cada um enfrentando dilemas morais e espirituais profundos. A trama é cuidadosamente tecida em meio a cenários majestosos e menos explorados que a icônica colunata de Bernini, oferecendo uma riqueza visual que realça a tensão narrativa.

Contexto

A eleição do Papa "liberal", o Cardeal Vincent Benítez, também conhecido como Inocêncio XIV, marca um ponto de inflexão significativo no filme.

A derrota do conservador Goffredo Tedesco simboliza a potencial renovação dentro da própria Igreja, uma cena simbólica em que uma abertura no teto da Capela Sistina traz luz e ar fresco, sugerindo novos começos e diálogos com o mundo contemporâneo.

O filme não apenas entretém, mas também provoca reflexões críticas sobre o papel da Igreja na sociedade moderna. Através das palavras do Cardeal Benítez, que enfatiza que "a luta está dentro de nós", "Conclave" desafia a visão tradicionalista e propõe uma Igreja que se adapta e responde às questões sociais e espirituais urgentes.

O desafio apresentado pelo filme é como a Igreja pode oferecer esperança, teologicamente profunda e culturalmente relevante, em tempos de crise moral e espiritual.

Foto: Vatican Media

Esses aspectos fazem de "Conclave" não apenas uma obra cinematográfica de destaque, mas também uma ferramenta de diálogo sobre a evolução da fé em tempos modernos.

"Conclave" vai além de uma simples dramatização dos bastidores do Vaticano, oferecendo uma poderosa meditação sobre a visão do Papa Francisco de uma "Igreja em saída". Esta expressão, cunhada pelo próprio Pontífice, refere-se a uma Igreja que não fica confinada aos seus templos e doutrinas, mas que se aventura no mundo para alcançar e servir aqueles que estão nas periferias da sociedade, tanto física quanto espiritualmente.

No filme, a eleição de Inocêncio XIV é uma metáfora para um novo começo, onde a Igreja mostra-se disposta a dialogar não apenas internamente, mas também com o mundo em geral.

Foto: Vatican Media

O gesto simbólico da luz entrando através do teto da Capela Sistina sugere uma abertura literal e figurativa para novas ideias e interações. Este Papa "liberal" reflete o desejo de uma Igreja que ouve e responde às angústias e esperanças da humanidade contemporânea, em consonância com a visão de Francisco de uma fé ativa e engajada.

A narrativa de "Conclave" ressalta que os maiores desafios da Igreja não são apenas externos, mas também internos. O Cardeal Benítez, ao se opor à ideia de uma nova cruzada proposta por seu rival conservador, enfatiza que a verdadeira luta está dentro da própria Igreja. A "Igreja em saída" proposta por Francisco busca superar essas lutas internas, promovendo uma renovação espiritual que é necessária para que ela possa efetivamente servir e liderar no mundo moderno.

Uma Igreja em saída

O filme também indica como a Igreja pode oferecer razões de esperança que são relevantes tanto teologicamente quanto culturalmente. Em um mundo fragmentado por crises econômicas, políticas e ambientais, a Igreja é chamada a ser um farol de solidariedade, compaixão e justiça. O conceito de "igreja em saída" envolve ir além das palavras e realizar ações concretas que refletem os ensinamentos do Evangelho de maneira prática e acessível a todos.

"Conclave", portanto, não apenas conta a história de um momento decisivo dentro do Vaticano, mas também serve como um reflexo da missão maior que o Papa Francisco tem buscado inspirar: uma Igreja que é verdadeiramente global, inclusiva e proativa em sua missão de amor e serviço.

Esta abordagem não só ressoa com os fiéis dentro da Igreja, mas também tem o potencial de tocar aqueles que estão à margem, mostrando que a fé pode ser um instrumento de mudança e esperança no mundo contemporâneo.


René Dentz é professor do Departamento de Filosofia da PUC-Minas, onde também é coordenador da Pós-Graduação em Teologia e Psicanálise, psicanalista, Doutor em Teologia pela FAJE e Pós-Doutorado em Teologia pela Université de Fribourg, na Suíça. Autor do livro “Perdão: diálogos entre a filosofia e a teologia” (Paulinas, 2024).

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