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O perdão no contexto terapêutico

Foto: Pexels

Na clínica, acolhendo as narrativas familiares, é comum identificar, nas entrelinhas daquelas descrições proferidas pelos pacientes, um enredo comum e presente nas tramas familiares: a atribuição de papéis como os de “vítima”, “agressor” e “salvador” para seus integrantes.

Fora da trama familiar, nas demais relações que estabelecem, sem perceber, ou seja, de forma inconsciente, reproduzem esse mesmo script, delegando papéis e identificando-se como “vítimas”.

Para existir uma “vítima”, é necessário existir um “salvador” e um “agressor”, estes últimos, com certa frequência, sendo delegados a uma mesma pessoa, quando esta não atende às expectativas e não assume a responsabilidade de suprir e preencher carências e vazios deixados pelas experiências passadas mal resolvidas.

Sem perceber, acabamos nos colocando em situações que claramente podem nos fazer mal. Presos ao passado em uma posição passiva, identificando-nos com o papel de “vítima”, não é possível atualizar o presente para um novo enredo, um novo possível. Sem o perdão, estamos fadados a uma repetição, a uma reprise da mesma história.

Os personagens podem ser diferentes e até ter roupagens também diferentes, mas, ainda assim, a trama se mantém a mesma! Cada um exercendo as mesmas funções a ele destinadas, impedindo, assim, o amadurecimento emocional.

O ser adulto é aquele que perdoa o passado e assume sua parcela de responsabilidade nas relações que estabelece no presente. Esse posicionamento geralmente não se dá, o que leva o sistema a produzir um bode expiatório, depositário das questões da família ou casal (GROISMAN, Moises, 2013, p. 15).

Além disso, percebe-se de maneira não incomum a existência da expectativa equivocada de que, para “seguir em frente”, deve ser necessário o arrependimento da outra pessoa diante daquilo que ela cometeu ou praticou. Novamente, a pessoa se coloca em uma posição de assujeitamento. O “poder” é dado e passa a estar nas mãos do outro, no que diz respeito ao direcionamento que a vida irá tomar.

Formas do perdão

Pode ocorrer de forma unilateral: a “vítima” não deseja reconciliar-se ou vir a manter uma relação com o “agressor”.

Benefícios:

Evitar que o ressentimento, a mágoa, a ferida não estancada a paralisem nessa posição de “vítima”, cobrando eternamente um pagamento do ato praticado;

Evitar que venha a estabelecer novos relacionamentos, colocando-se em situação de risco para ser abusado;

Evitar que o rancor se transforme em doença física ou mental;

Pode ocorrer de forma bilateral: quando existe o arrependimento do “transgressor” e a “vítima” deseja manter e/ou retomar um relacionamento (convivência) com ele.

Em seu livro, Moises (2013) irá dizer que o ato em si é imperdoável, mas o sujeito por trás do ato é passível de recuperação. Para isso, será necessário avaliar o tipo do ato, sua repetição ou não, o nível de comprometimento emocional, se existe de fato uma disposição genuína e arrependimento do agressor, se a reparação é possível, como reparar, o grau de inserção familiar, conjugal e social do “agressor” e da “vítima”.

Para refletirmos um pouco mais…

O poder do perdão é algo extremamente benéfico para a melhora dos relacionamentos familiares, conjugais, entre amigos e, principalmente, consigo mesmo. A tolerância, a compaixão, a bondade e o perdão podem e devem ser aprendidos a partir do exercício de se relacionar com o outro.

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Quando entendemos que a outra pessoa é tão falha quanto nós mesmos, podemos revelar nossas vulnerabilidades e aceitar as do próximo. Só é possível viver juntos quando buscamos ativamente desenvolver formas mais leves, sinceras, respeitosas e acolhedoras em nossos relacionamentos.

Podemos pensar que, para além da manutenção dos relacionamentos, o maior benefício do ato de perdoar recai sobre aquele que perdoa. Gosto de pensar que o perdão não é sinônimo de esquecer, mas, sim, um “lembrar sem dor”, como uma pequena cicatriz que não compromete os seus movimentos, mas serve como um sinal de que você merece ter cuidado consigo mesmo.

Entendo, também, que o perdão não é a conclusão do processo de cura, mas, sim, o seu início! Ao perdoar, permito-me seguir em frente, abrindo-me para novos possíveis.

Fica o convite: comece se perdoando e, aos pouquinhos, estenda esse dom para as demais pessoas significativas em sua vida. O ato de ter compaixão consigo mesmo é o primeiro passo para legitimar os sentimentos, aceitar e reconhecer vulnerabilidades pessoais. Você merece sair desse lugar. Vamos juntos?

 

Wellerson Matheus da Silva é psicólogo clínico, especialista em Terapia de Casal e Terapia Sexual. Seu foco principal é o atendimento de adultos, na modalidade individual e casal, atuando e desenvolvendo temas como: dinâmica relacional, conjugalidade, comunicação, dependência emocional, sexualidade, masculinidades e inteligência emocional. CRP 04/54324 (E-mail: [email protected]  | WhatsApp: 31 9 9419-8304).  Instagram: @institutopsicologiamedica

 

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