O provérbio localizado no versículo 3 do capítulo 16 é uma mensagem sobre confiança, já que a fé religiosa é o que conecta pessoas ao divino, mas conexão com o divino não combina com fatalismo, isto é, igualar a esperança da fé a um destino rígido, pronto e determinado. A esperança da fé católica acredita; por isso ensina que a graça divina sem a liberdade humana é tirania e a liberdade humana sem a graça divina é ilusão.
O fazer humano (igual às obras) é fruto do querer divino, visto que as mulheres e os homens são obras das mãos divinas; logo, a existência humana é uma manifestação da bondade do Criador que cria um ser livre, por esse motivo capaz de construir (ou destruir); gerar vida (ou morte); fazer o bem (ou o mal). A graça divina inspira, fortalece e sustenta, mas é a resposta livre da pessoa que dá sentido e concretude às ações e vivências do cotidiano.
A liberdade é desafiadora, e até assusta! Mas o que livremente cria, Deus, dispõe aos seres humanos a condição de liberdade: somos livres para confiar (e não confiar), para perdoar (e não perdoar), para amar (e não amar). Deus não é impositor; ele não é também vingativo nem opressor. Por esse motivo, Deus, o que insufla a liberdade, é aquele que oportuniza às mulheres e aos homens a condição de seres para a liberdade.
Um ato de liberdade
A mensagem proverbial – “Confia ao Senhor as tuas obras e teus pensamentos serão estabelecidos” – não é uma anulação da liberdade humana, mas um convite a um ato de liberdade madura, uma vez que entregar os próprios planos a Deus não é renunciar à vontade própria, mas permitir que ela seja sustentada, iluminada e orientada pela sabedoria divina.
A confiança da esperança da fé é a atitude que revela que Deus é o primeiro agente da confiança, porque ele é quem primeiramente confia na obra de suas mãos, as mulheres e os homens, posto que a “liberdade é um sinal grandioso da imagem divina no ser humano”. Essa liberdade, porém, não é um abandono ao acaso ou uma autonomia desenfreada, mas um chamado à corresponsabilidade, pois, ao confiar-nos a liberdade, Deus nos convida a cooperar com a sua graça, ordenando nossos pensamentos e ações ao bem.
Confiar nossas obras a Deus não é um ato de rendição passiva, mas uma resposta ativa ao amor divino, onde a graça aperfeiçoa a liberdade e a liberdade, iluminada pela fé, encontra sua plenitude ao buscar a vontade de Deus. As seguidoras e os seguidores de Jesus, ao agirem no mundo – seja no autocuidado, no desempenho de seus papéis profissionais ou na condução da própria vida, marcada por limites e potencialidades, tristezas e alegrias, angústias e esperanças –, testemunham sintonia com a força que move o existir: Deus.
E, assim, manifesta-se o dinamismo da graça, onde a liberdade humana e a vontade divina se entrelaçam, revelando que confiar as próprias “obras ao Senhor” não é afastar-se do mundo, mas agir nele com esperança e propósito, movido pela presença amorosa e inspiradora do divino.
José Fabrício Rodrigues dos Santos Cabral é doutor em Ciências da Religião. Atualmente é professor e pesquisador da Universidade Católica de Pernambuco.