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A discussão entre o ter e o ser não é nova, entre os filósofos que já abordaram o assunto estão o grego Sócrates (470-399 a.C.), o suíço Rousseau (1712-1778) e o alemão Erich Fromm (1900-1980).
Ser e Ter são dois modos de existência. Ter refere-se a coisas. Ser refere-se à experiência. A base para o “modo ter” é a de uma sociedade aquisitiva que repousa no lucro e no poder como pilares de sua existência. Já o “modo ser” é a intercessão da realidade com a interioridade, como prega o cristianismo.
Mas, olhe à sua volta e reflita: o que mais aparece para você nas redes sociais e demais canais de comunicação? Qual é a mensagem que recebemos o tempo todo?
Somos assediados por ações que visam o consumo. E consumir é tão bom, traz uma satisfação imediata, não é mesmo? Só que quando percebemos, queremos mais. E o ciclo vicioso está criado, uma corrida do ego a ser percorrido pela imagem de segurança, conforto e status.
Mesmo desejando nadar contra a corrente, somos educados para esse tipo de sucesso e vamos cegos rumo a uma ética da estética. Vivemos numa sociedade onde o ter é muito mais valorizado, abre mais portas do que o ser.
O apelo das redes sociais
Recentemente o Papa Francisco afirmou que “o caminho do escondimento é o caminho de Deus” e que esta é uma profecia poderosa para a nossa época, poluída pelo aparecer e pelas aparências. “Parece que, por causa do aparecer e das aparências, vivemos uma cultura de maquiagem: todos usam maquiagem, é normal que as mulheres o façam, mas todos, todos usam maquiagem, para parecerem melhores do que são, e isso não é do Senhor”, observou.
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Há anos o papa Francisco fala sobre esta questão, alertando para o risco de esquecer quem somos, obcecados por milhares de aparências, por mensagens esmagadoras que fazem a vida depender das roupas que vestimos, do carro que conduzimos, da maneira como os outros nos olham.
Para a jornalista e doutora em Comunicação, Ir. Joana Puntel, é crescente o número de pessoas que usam as redes sociais como ferramenta de autopromoção. “Recebemos uma avalanche de informações e propaganda, tudo é patrocinado, as marcas estão por trás, querendo obter lucro. As próprias plataformas também visam o lucro e por isso incentivam essa autopromoção ao ponto de causar dependência. As pessoas não conseguem mais viver sem aquele produto, sem consumir aquele serviço, sem se ‘maquiar’”, aponta.
Jovens: influenciadores ou influenciados?
Francisco já relacionou o tema aos jovens. Pediu para que eles não se deixem enganar pelos “algoritmos” e “ilusões do virtual”. “Deus te chamar pelo nome significa que, para Ele, você não é um número, mas um rosto, um rosto e um coração. Gostaria que vissem uma coisa: muitas pessoas hoje sabem o seu nome, mas não te chamam pelo nome. De fato, o seu nome é conhecido, aparece nas redes sociais, é elaborado por algoritmos que o associam a gostos e preferências. Mas tudo isto não interpela a sua singularidade, mas a sua utilidade para os estudos de mercado”, alertou.
Muitas vezes o que se mostra on-line não é condizente com a vida que se leva off-line. Será possível resistir à cultura da maquiagem? Como deixar de lado a fixação pela aparência?
Para a Ir. Joana Puntel não é preciso negar a maquiagem, mas fazer com que a sua vida não dependa dela. “Há que ter equilíbrio. Pergunte-se: Como estou vivendo? Estou me deixando levar pelos apelos do consumo? Faça uma análise sobre os produtos que você usa: são todos realmente necessários? Veja se você dá atenção aos estudos, aos valores e amizades da mesma forma como se dedica a sua aparência. Ter autoestima é excelente, mas essa preocupação exagerada faz mal, afasta do que é real”, orienta.
A ideia não é viver fora da realidade em que estamos inseridos, mas trocar a competição por cooperação, ter uma atuação consciente sobre o consumo, respeitando a natureza e colocando em prática o equilíbrio entre ser e ter.
Juliana Borga é jornalista, três vezes vencedora do Prêmio Dom Hélder Câmara de Imprensa. É mãe coruja da Helena e adora escrever sobre temas que colaboram para um mundo mais humano e solidário. Instagram: @juborgajornalista